A conservação do Cerrado e de suas populações tradicionais está ameaçada pelos intensos desmatamentos, incêndios e uso inadequado de água para irrigação no Mosaico Sertão Veredas Peruaçu, uma área significativa de aproximadamente 1,8 milhão de hectares situada no norte/noroeste de Minas Gerais e sudoeste da Bahia. É o que aponta o mapeamento do uso do solo produzido pelo WWF-Brasil já em sua terceira versão.
Segundo o estudo, a região do Mosaico está ocupada com 37% de atividade agropecuária. Outro dado que preocupa é o fato do território apresentar altos índices de desmatamento e queimadas nos últimos anos, por exemplo, no período de 2009-2016 foram desmatados 30.043 hectares, uma área que equivale quase ao tamanho da cidade de Belo Horizonte. Entre as unidades de conservação mais afetadas no Mosaico, a Área de Proteção Ambiental (APA) Pandeiros, que é a maior na categoria de uso sustentável do estado de Minas Gerais, está no topo, com 5.116 hectares desmatados.
Para Cássio Bernardino, analista de conservação do WWF-Brasil e coordenador do mapeamento, “os estudos permitem identificar áreas onde os desmatamentos e as queimadas são mais frequentes, possibilitando o desenvolvimento de estratégias de prevenção e fiscalização. A iniciativa também permite acompanhar a mudança de uso do solo na região, e destaca o papel das unidades de conservação de proteção integral para a proteção contra o desmatamento e incêndios”.
Esses dados servem como forte alerta para que as autoridades e a sociedade civil tomem medidas que busquem conter esses fatores de degradação e perda da biodiversidade desse que é o bioma considerado como a “Caixa d’água do Brasil”, já que as nascentes presentes no bioma são responsáveis por alimentar 6 das 9 principais bacias hidrográficas do país.
O mapa abaixo dá uma dimensão da dinâmica de desmatamento no MSVP.
Seminário de Uso do Solo e Incêndios do Mosaico Sertão Veredas – Peruaçu
A apresentação do mapeamento aconteceu durante o Seminário realizado nos dias 28 e 29 de Junho na cidade de Januária-MG, com a presença de autoridades municipais, órgãos ambientais, membros dos conselhos das áreas protegidas, gestores das unidades de conservação, lideranças indígenas e de comunidades tradicionais, ONGs ambientais, Ministério Público e universidades.
Outra constatação, que gerou comoção nos participantes, foi sobre o risco de as veredas e rios da região secarem no período de 20 anos. A informação foi levantada pelo pesquisador Walter Viana, em sua tese de doutorado em recursos hídricos pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que concluiu que o consumo de água está maior que a oferta, sendo a implantação de postos tubulares os principais responsáveis por este quadro. Segundo ele, “além do alto consumo, estes postos estão interceptando as nascentes, o que compromete a disponibilidade hídrica de rios importantes, como, por exemplo, o Peruaçu que tem hoje sua vazão reduzida em 10% em relação aos anos 80”. Por fim, “se medidas urgentes não forem adotadas por parte das autoridades, a região sofrerá de um enorme problema socioambiental”, afirmou Viana.
Durante o evento, as mais de cem pessoas defenderam que não há mais espaço para uma cultura de abundância e de desperdício, como se houvesse um estoque infinito do Cerrado para derrubar, de água onde lançar poluentes e de terras para minerar. Um plano de ações para redução de riscos e que torne o Mosaico um norteador do desenvolvimento sustentável deste território foi construído na ocasião.
Logo, alterar modelos de produção e uso da terra, investir no agroextrativismo produzido pelas populações tradicionais, criar novas tecnologias sociais de acesso à agua, divulgar a região como possível destino para o turismo ecológico de base comunitária e monitorar áreas protegidas foram listadas como ações inteligentes e estratégicas. A produção agropecuária também precisa fazer sua parte e investir em técnicas para que melhores práticas sejam implementadas, como conservação de água e solo, manejo e recuperação de áreas degradadas e integração lavoura-pecuária-floresta.
Imagem em destaque: WWF-Brasil/André Dib